O Rio Grande do Norte registrou 39 chacinas entre os anos de 1988 e 2023, segundo o Mapa de Chacinas: regiões Norte e Nordeste, um levantamento realizado pela Rede Liberdade em parceria com a Clínica de Direitos Humanos do IDP. O estudo, que também serviu como base para contribuições apresentadas à Organização das Nações Unidas (ONU), expõe dados alarmantes sobre a violência nas regiões Norte e Nordeste do Brasil.
Entre os 489 eventos de chacinas registrados no período, 339 ocorreram no Nordeste, resultando em 1.291 mortes. O Rio Grande do Norte é um dos estados mais atingidos na região, superando Pernambuco, que registrou 37 eventos.
O estudo revelou que 2015 foi o ano com o maior número de eventos de chacinas registrados, totalizando 64 casos em todo o Norte e Nordeste. Já 2017 destacou-se pelo maior número de mortes no período analisado, com 382 vítimas fatais. Esses picos evidenciam uma intensificação da violência em períodos específicos, geralmente associada a dinâmicas do tráfico de drogas, ações de milícias e conflitos entre facções criminosas.
No Rio Grande do Norte, a distribuição temporal das chacinas segue um padrão semelhante ao das demais regiões, mas o estudo não detalhou os anos específicos de maior concentração no estado. Contudo, os dados gerais reforçam que eventos de chacinas são contínuos e crescentes ao longo das décadas.
As cidades mais atingidas no Rio Grande do Norte
No Rio Grande do Norte, os municípios que mais registraram chacinas foram Natal, Mossoró, Nísia Floresta e Extremoz, de acordo com os dados levantados. O relatório não detalha as condições específicas de cada evento no estado, mas reforça que a ausência de dados oficiais sobre as vítimas — como raça, idade e situação socioeconômica — dificulta análises mais profundas.
“O dado mais importante que se obteve é o de apagamento dessas vítimas, que, ao nosso ver, serve para a manutenção de um projeto de destruição material de corpos e populações julgados como descartáveis e supérfluos, caracterizados como vidas matáveis e sem valor”, destaca o documento.
No Rio Grande do Norte, as chacinas foram frequentemente associadas a dinâmicas de tráfico de drogas e conflitos envolvendo agentes de segurança pública. Apesar disso, o relatório afirma que há uma ausência de políticas públicas que promovam a reparação adequada para as famílias afetadas e ações efetivas que impeçam a repetição desses crimes. A pesquisa reforça que o problema não é apenas a violência em si, mas a falta de responsabilização. “A inconsistência quanto aos dados das vítimas denota ausência de políticas de reparação adequadas”, aponta o relatório.
Além disso, o estudo sugere que o aumento do número de registros a partir de 2011 também está relacionado à fragmentação de facções criminosas e à interiorização da atuação de milícias, que intensificaram a violência em localidades antes pouco monitoradas.
Contexto regional
O estado da Bahia lidera em número de chacinas no Nordeste, com 103 casos, sendo 46 apenas em Salvador. O Ceará aparece em segundo lugar, com 75 registros, seguido pelo Rio Grande do Norte (39 eventos) e Pernambuco (37 casos). Outros estados com números expressivos incluem Alagoas (33 casos) e Paraíba (25 registros). Sergipe registrou 14 eventos, enquanto o Piauí e o Maranhão apresentaram os números mais baixos, com 10 e 3 casos, respectivamente.
A concentração de casos no Nordeste representa 69,3% de todas as chacinas registradas no estudo, enquanto a região Norte foi responsável por 30,7%, com 150 eventos e 826 mortes.
Falhas no sistema
O estudo aponta que a falta de um sistema de monitoramento nacional unificado e de uma base de dados oficial contribui para a invisibilidade desses eventos, agravando a dificuldade de responsabilizar os culpados. “Há uma violência direcionada e uma omissão persistente das autoridades em proteger essas comunidades. Esse cenário exige uma resposta urgente e um comprometimento do Estado”, afirma Amarílis Costa, diretora-executiva da Rede Liberdade.
Os pesquisadores destacam ainda que muitas chacinas ocorrem em territórios vulneráveis, especialmente em comunidades negras, quilombolas e indígenas, mas alertam que a ausência de informações oficiais impede uma análise completa. De acordo com o estudo, a subnotificação foi particularmente grave nos anos 1990, quando registros de eventos foram limitados por dados incompletos e pela pouca cobertura jornalística. Apenas a partir de 2011, com o aumento da atenção midiática ao termo “chacina”, os dados começaram a se consolidar.
“Este estudo mostra que comunidades inteiras permanecem desprotegidas, e o Estado falha em oferecer políticas de reparação para as famílias das vítimas”, observa Rodrigo Portela, consultor e um dos pesquisadores do levantamento.
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