O cenário profissional brasileiro apresenta diversas modalidades de ocupação, cada uma com suas particularidades. O trabalhador *informal*, o *autônomo*, o *Microempreendedor Individual (MEI)* e o profissional *liberal* são categorias relacionadas ao trabalho por conta própria, um conceito definido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entenda as diferenças:
De acordo com Felipe Vella Pateo, técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o trabalhador por conta própria é aquele que atua sem subordinação, ou seja, não possui um chefe nem é chefe de outros. No entanto, Pateo ressalta que existem trabalhadores informais que não se enquadram nessa categoria, os chamados "assalariados informais", que possuem um chefe, mas não têm carteira assinada.
A Inflação apresenta desaceleração em todas as faixas de renda em março, aponta Ipea. Em comparação com o regime celetista (CLT), o trabalho por conta própria oferece a opção de contribuição previdenciária reduzida e isenção de encargos como o FGTS, além de maior flexibilidade de jornada. No entanto, essa modalidade não garante direitos como férias remuneradas, estabilidade salarial e acesso ao sistema de proteção ao trabalhador em casos de desemprego, como FGTS, seguro-desemprego e multa rescisória.
O que define o trabalho informal?
Segundo Viviann Brito Mattos, titular da Coordenadoria Nacional de Promoção da Liberdade Sindical e do Diálogo Social (Conalis) do Ministério Público do Trabalho (MPT), o trabalhador informal se caracteriza pela falta de acesso aos direitos sociais previstos em lei, como registro em carteira (CLT), contribuição ao INSS, FGTS, férias remuneradas, 13º salário e proteção contra demissão arbitrária. A ausência de um contrato formal também implica a inexistência de deveres tributários ou previdenciários por parte do empregador ou do próprio trabalhador.
A informalidade, portanto, representa uma forma precária de inserção no mercado de trabalho, marcada pela insegurança de renda, ausência de organização coletiva, dificuldade de acesso a direitos fundamentais e inexistência de mecanismos de proteção social.
Diferenças entre os tipos de trabalhadores
- Trabalhador informal: exerce atividades econômicas sem registro legal ou formalização perante o Estado, sem carteira assinada, CNPJ ou contribuição regular à Previdência Social.
- Trabalhador autônomo: exerce atividade por conta própria, sem subordinação a empregadores e sem empregados. Pode ou não ser formalizado com CNPJ ou inscrição como contribuinte individual no INSS, atuando com liberdade técnica e organizacional.
- Microempreendedor Individual (MEI): formalização simplificada do trabalhador por conta própria, criada pela Lei Complementar nº 128 de 19 de dezembro de 2008. Permite a inscrição como pessoa jurídica, emissão de nota fiscal, acesso a benefícios previdenciários e enquadramento tributário facilitado.
- Profissional liberal: exerce profissão regulamentada por lei (médicos, advogados, arquitetos, engenheiros), podendo trabalhar de forma autônoma ou em empresa própria. Requer habilitação legal e está sujeito a normas específicas da profissão.
Vantagens e desvantagens da informalidade
A informalidade pode apresentar vantagens aparentes, como menor carga tributária imediata, flexibilidade de horários e facilidade de entrada no mercado de trabalho. No entanto, as desvantagens superam esses benefícios, incluindo a ausência de proteção social, insegurança jurídica e financeira, invisibilidade institucional e prejuízos a longo prazo.
Vantagens do trabalho formal (CLT)
- Registro em carteira com direitos assegurados.
- Contribuição compulsória ao INSS.
- Acesso automático a benefícios previdenciários e trabalhistas.
- Proteção contra demissão sem justa causa ou por motivo discriminatório.
- Direito a férias, 13º salário, FGTS, entre outros.
- Estrutura coletiva de proteção (sindicatos e justiça do trabalho).
Microempreendedor Individual (MEI)
Segundo Priscila Dibi Schvarcz, vice-coordenadora nacional da Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho (Conafret) do MPT, o MEI se caracteriza pela autonomia na organização e execução do próprio trabalho. Para se enquadrar como MEI, a receita bruta anual não pode ultrapassar R$ 81 mil, e a atividade econômica deve estar na lista autorizada pelo Conselho Gestor do Simples Nacional. Um Deputado propõe aumento de limite para o MEI em 2025.
O MEI possui CNPJ e deve emitir nota fiscal eletrônica de serviço, recolhendo uma alíquota de 5% sobre o salário mínimo para a previdência social. O acesso aos benefícios previdenciários é limitado, e a aposentadoria não contempla a opção de tempo de contribuição, a menos que o microempreendedor faça um recolhimento complementar de 15%.
Dados do IBGE de 2022 indicam que o Brasil possui 14,6 milhões de MEIs, correspondendo a aproximadamente 70% do total de empresas no país. Leandro Marinho, gerente de atendimento do Sebrae Rio, destaca que o processo de formalização como MEI é gratuito e pode ser realizado online, através do portal do empreendedor.
Modalidades de trabalho: registro, direitos, deveres e proteção social
Modalidade |
Registro legal |
Direitos garantidos |
Deveres/ tributos |
Proteção Social |
Trabalho Formal (CLT) |
Carteira assinada; contrato regido pela CLT |
Férias, 13º salário, FGTS, INSS, adicional noturno/periculosidade, aviso prévio, seguro-desemprego, licença-maternidade, estabilidade em casos especiais |
INSS (parte do empregado), IRRF, contribuição patronal, FGTS |
Alta: seguridade social ampla, acesso automático a benefícios do INSS |
Servidor Público |
Concurso; regime estatutário |
Estabilidade após estágio probatório, aposentadoria pelo RPPS, licença remunerada, adicionais, gratificações específicas, além de outros direitos |
Contribuição previdenciária ao RPPS, IR (se aplicável) |
Alta: garantias institucionais e aposentadoria diferenciada |
Informal |
Sem registro, sem CNPJ |
Nenhum garantido por lei; sem férias, 13º, aposentadoria, FGTS ou seguro-desemprego |
Nenhum obrigatório; pode não contribuir ao INSS ou pagar impostos |
Inexistente ou muito baixa: sem vínculo, sem acesso automático à previdência ou programas sociais |
Autônomo |
Pode ter ou não CNPJ; contribui como pessoa física |
Nenhum garantido automaticamente; pode acessar benefícios do INSS se contribuir voluntariamente como contribuinte individual |
INSS (20% sobre rendimento, mínimo de 1 salário mínimo); IR (se aplicável) |
Média-baixa: depende da regularidade da contribuição previdenciária |
MEI |
CNPJ e enquadramento no Simples Nacional |
Acesso a aposentadoria, auxílio-doença, salário-maternidade (mínimo de 12 meses de contribuição), possibilidade de nota fiscal e conta PJ |
Pagamento fixo mensal com limitação do faturamento |
Média-baixa: depende da regularidade da contribuição previdenciária, mas, a princípio, acesso simplificado à Previdência Social e programas de apoio |
Profissional Liberal |
CNPJ (empresa ou sociedade) ou CPF com registro em conselho |
Sem garantias legais trabalhistas; pode contratar plano de previdência privada ou contribuir ao INSS como individual |
Contribuições ao conselho de classe, INSS (20%), IR, e tributos conforme regime tributário (Simples, Lucro Presumido etc.) |
Variável: depende da contribuição; pode ter acesso ao INSS e benefícios correlatos |
A 'pejotização'
A procuradora do Trabalho, Priscila Dibi Schvarcz, alerta para a "pejotização", uma prática considerada fraude à relação de emprego. Ela explica que a prestação de serviços por meio de pessoas jurídicas exige a transferência do serviço do tomador para a pessoa jurídica contratada, com autonomia na organização e gestão da atividade. No entanto, quando a contratante visa à prestação de serviços pessoais pelo contratado, inserindo-o em seu processo produtivo, ocorre a "pejotização", que consiste na contratação de trabalhador subordinado por meio de pessoa jurídica para ocultar o vínculo empregatício. O STF suspende ações sobre ‘pejotização’ e divide opiniões entre juristas e associações.
O ministro Gilmar Mendes, do STF, suspendeu a tramitação de todos os processos na Justiça brasileira que discutem a legalidade da "pejotização". Segundo a procuradora do Trabalho, se o trabalho é prestado com pessoalidade, habitualidade, subordinação e mediante salário, está caracterizada a relação de emprego, e a contratação formal autônoma serve apenas como simulação para fraudar os artigos 2º e 3º da CLT.
A imagem negativa da CLT
Viviann Brito Mattos, da Conalis, observa que o avanço da informalidade, a precarização das relações de trabalho e a multiplicação de ocupações por conta própria têm levado muitos jovens a desenvolverem uma representação negativa do trabalho formal, especialmente daquele regulado pela CLT. Em muitos casos, "ser CLT" é utilizado de forma pejorativa, como sinônimo de fracasso, dependência ou submissão.
No entanto, a procuradora do Trabalho defende que essa representação precisa ser questionada, pois a inserção formal via CLT representa a garantia de um conjunto de direitos fundamentais historicamente conquistados pelos trabalhadores. Para ela, é preciso romper com o estigma que associa o trabalho com carteira assinada à mediocridade e defender o trabalho formal como forma de fortalecer a cidadania.