Um marco histórico na educação infantil brasileira foi revelado pelo Censo Escolar 2024, divulgado nesta quarta-feira (9) pelo Ministério da Educação (MEC). Pela primeira vez, a porcentagem de crianças negras (40,2%) matriculadas em creches no Brasil ultrapassou a de crianças brancas (38,3%) no ano passado. Em 2023, os números eram de 35,1% para crianças brancas e 34,7% para negras.
O aumento foi ainda mais expressivo nas creches públicas, onde a proporção de crianças negras saltou de 38% para 45%. Mariana Luz, diretora executiva da Fundação Maria Cecília Souto Vidigal, que atua na defesa dos direitos da infância, classificou o dado como significativo e importante.
“É a primeira vez que há um aumento do número de crianças negras na série histórica. Também é a primeira vez que o número de crianças negras ultrapassa o de brancas na creche“, afirmou Luz.
Apesar do avanço, a diretora da fundação ressalta que o aumento ainda é insuficiente, considerando a necessidade de reparação histórica. Segundo ela, os dados do Cadastro Único (CadÚnico) mostram que as crianças negras são as mais vulnerabilizadas e, portanto, deveriam ter prioridade na inclusão em creches. Inclusive, em Natal, uma PPP está sendo estudada para modernizar e expandir a rede de creches, beneficiando milhares de crianças.
De acordo com a especialista, é essencial realizar uma busca ativa de crianças negras para assegurar seu direito à educação. Atualmente, a maior parte das crianças brasileiras frequenta creches públicas (66%).
Mariana Luz destaca que o Brasil tem registrado um aumento constante nas matrículas na educação infantil, que compreende as primeiras etapas da educação básica. “Elas são fases estruturantes para o processo de desenvolvimento da criança. A da primeira infância, que compõe essas duas etapas escolares, é uma fase onde há um pico de desenvolvimento”, explica.
A fase da educação infantil, segundo Luz, é um período em que o cérebro está em pleno desenvolvimento, realizando um milhão de conexões por segundo. Até os seis anos de idade, 90% do cérebro já está formado.
“Quando a criança recebe uma educação de qualidade na educação infantil, ela tem o maior potencial de ter uma jornada educacional ao longo de toda a sua vida, na qual vai aprender até três vezes mais“, afirma.
Entre os benefícios da educação infantil, Luz cita o estímulo ao desenvolvimento cognitivo e socioemocional, além de impactos econômicos futuros. Estudos comprovam que uma educação infantil de qualidade gera retornos econômicos, como maior inserção no mercado de trabalho.
Apesar do crescimento de 1,5% no número de matrículas em creches e do fato de que 59% das crianças estão em tempo integral, a especialista aponta para uma estagnação nas matrículas. Embora não tenha havido retrocesso, a melhora não é significativa. O Plano Nacional de Educação (PNE) estabelece a meta de 50% das crianças em creches, mas a porcentagem atual é de 38,7%. O Censo Escolar 2024 também apontou para um forte crescimento nas matrículas em tempo integral e no ensino profissionalizante.
O censo também revelou uma queda de 0,6% nas matrículas na pré-escola. De acordo com Mariana Luz, as crianças que estão fora da pré-escola são, em sua maioria, aquelas em maior vulnerabilidade socioeconômica, que mais se beneficiariam da inserção em um ambiente de aprendizagem, desenvolvimento e proteção.
Embora a responsabilidade pela educação infantil seja da gestão municipal, Luz lembra que é preciso considerar o pacto federativo para que estados e União garantam a oferta desse serviço com qualidade, infraestrutura e professores qualificados.
“Um sistema que de fato olhe para a criança como prioridade absoluta. Que entenda essa fase da vida como a maior janela de oportunidade para quebrar os ciclos intergeracionais de pobreza e para enfrentar as tamanhas desigualdades do nosso país“, concluiu.
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