Política

Movimentos sociais exigem revisão de concessões de saneamento básico em audiência na Câmara

Em uma audiência pública na Comissão de Legislação Participativa da Câmara dos Deputados, movimentos sociais e organizações da sociedade civil expressaram forte preocupação com a privatização dos serviços de água e saneamento. A Rede de Vigilância Popular em Saneamento e Saúde liderou as cobranças, exigindo a revisão imediata dos contratos de concessão firmados sob a égide da Lei do Saneamento Básico (14.026/20).

O cerne da questão, segundo os representantes da rede, é a crescente “mercantilização da água”, que tem resultado em graves problemas para a população. Bruno França, representante da rede no Rio de Janeiro, criticou duramente a substituição da Cedae pela concessionária Águas do Rio em 2021. Segundo ele, a privatização, que prometia eficiência e universalização, resultou em “um quadro de violações, abusos e ampliação da vulnerabilidade hídrica”. França relatou desabastecimento crônico, aumento de tarifas e abandono das áreas mais necessitadas, questionando a cobrança de tarifa de esgoto em locais sem infraestrutura.

A situação em outros estados também foi debatida. Vicente Lutz, do Rio Grande do Sul, apontou que a concessão da estatal ao consórcio Aegea trouxe “muitos prejuízos para a população gaúcha”, citando a subvalorização da companhia e a precarização dos serviços. Rompimentos de adutoras e frequentes pedidos de reequilíbrio financeiro foram mencionados como problemas recorrentes em estados como Alagoas, Sergipe e Pará, além do Rio Grande do Sul.

João Roberto Lopes, professor da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio) e membro da rede, denunciou a presença de grandes grupos financeiros internacionais no controle das concessionárias. Segundo ele, o modelo de gestão, com fundos como o Fundo Soberano de Singapura, o Fundo de Pensão dos Servidores Públicos do Canadá, BlackRock, Brookfield e Itaú, prioriza a lógica financeira em detrimento da qualidade dos serviços. Lopes destacou que a Águas do Rio distribuiu 78% do seu lucro líquido de R$ 1,2 bilhão em 2023 aos acionistas, um valor cinco vezes maior do que o previsto para o saneamento da favela da Rocinha em cinco anos, exemplificando a prioridade dada ao lucro em relação ao investimento.

O deputado Glauber Braga (Psol-RJ), presidente da Comissão de Legislação Participativa e organizador do debate, defendeu a reestatização do setor, questionando a lógica de empréstimos públicos para empresas privadas quando o mesmo poderia ser feito para as estatais. “O argumento normalmente utilizado para a privatização é: ‘o Estado não tem recursos suficientes para fazer os investimentos que são necessários para a universalização do serviço’. Só que aí, na hora H, quem vai custear os investimentos não são recursos do setor privado; é o Estado, somos nós. Por que, então, esses empréstimos públicos não são feitos para as estatais para que esse investimento seja feito pelas estatais de saneamento, como Cedae e outras companhias?”, indagou.

Em contrapartida, a superintendente de saneamento do BNDES, Luciene Machado, apontou que, apesar do aumento da participação privada, a maior parte dos serviços continua a ser prestada por municípios ou companhias estaduais. Ela defendeu o fortalecimento da fiscalização da Agência Nacional de Água e Saneamento (ANA) para garantir a qualidade dos serviços, independentemente do modelo de gestão. A pesquisadora da Fiocruz, Adriana Sotero, enfatizou a necessidade de que as concessões detalhem os investimentos para alcançar a universalização do saneamento, destacando a importância de se erradicar as doenças relacionadas à falta de saneamento adequado.

A audiência pública na Câmara dos Deputados reforçou a preocupação com os impactos da privatização do saneamento, com movimentos sociais exigindo mudanças nos contratos e maior transparência nas ações das empresas concessionárias.

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Rafael Nicácio

Co-fundador e redator do Portal N10, sou responsável pela administração e produção de conteúdo do site, consolidando mais de uma década de experiência em comunicação digital. Minha trajetória inclui passagens por assessorias de comunicação do Governo do Estado do Rio Grande do Norte (ASCOM) e da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), onde atuei como estagiário. Desde 2013, trabalho diretamente com gestão de sites, colaborando na construção de portais de notícias e entretenimento. Atualmente, além de minhas atividades no Portal N10, também gerencio a página Dinastia Nerd, voltada para o público geek e de cultura pop. MTB Jornalista 0002472/RN E-mail para contato: [email protected]

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