O presidente da Argentina, Javier Milei, está em negociação com o Fundo Monetário Internacional (FMI) para um novo empréstimo de US$ 20 bilhões. O objetivo declarado é reforçar as reservas do Banco Central (BC) do país, embora críticos apontem que a medida visa, principalmente, conter a inflação em um cenário de escassez de dólares.
O ministro da Economia, Luis Caputo, confirmou o valor durante um evento do setor de seguros latino-americanos. “O montante que nós acordamos com o *staff* [equipe técnica do FMI], que o *board* [diretoria-executiva do Fundo] ainda precisa decidir se aprova ou não, é de US$ 20 bilhões. É muito superior ao montante que se vem escutando de algumas pessoas“, afirmou.
Detalhes sobre as condições impostas pelo FMI para a concessão do empréstimo ainda não foram divulgados. Caputo mencionou que o governo também busca linhas de crédito de “livre disponibilidade” junto ao Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF).
O anúncio do ministro ocorreu após um período de silêncio sobre as negociações, o que gerou especulações no mercado financeiro. Alejandro Olmos Gaona, diretor do Observatório da Dívida Pública Argentina, acredita que Caputo tenta acalmar o mercado diante da pressão cambial dos últimos dias, resultado de incertezas sobre o acordo com o FMI.
Gaona ressalta que o governo tem utilizado as reservas do BC para controlar artificialmente a taxa de câmbio, vendendo dólares no mercado. “Em um mês, US$ 1,4 bilhão foi gasto para acalmar o mercado de câmbio, e agora o dólar continua subindo. Esta declaração do ministro certamente, como ele disse, visa acalmar um pouco a taxa de câmbio e os mercados”, afirmou.
Para o diretor do Observatório da Dívida Argentina, o governo necessita urgentemente de dólares para fortalecer o Banco Central e controlar a inflação, fator crucial para a popularidade do presidente Milei. No entanto, questiona as condições do empréstimo e a destinação dos recursos.
A inflação na Argentina, embora ainda alta, apresentou queda, passando de 287% ao ano em março de 2024 para 66% ao ano em fevereiro de 2025, reflexo da recessão econômica.
Alejandro Olmos Gaona alertou para a constante diminuição das reservas do Banco Central, o que dificulta a manutenção de um câmbio artificialmente baixo. A imprensa argentina tem noticiado que o FMI pode exigir a redução ou eliminação dos controles cambiais, como a restrição à compra de até US$ 200 por mês por pessoa, o que tem intensificado a procura por dólares.
O governo Milei espera concluir o acordo até meados de abril. Este seria o terceiro empréstimo da Argentina com o FMI desde o acordo firmado em 2018, durante o governo de Maurício Macri, que previa US$ 56 bilhões em empréstimos.
O governo justifica a necessidade do empréstimo para “sanear” as reservas do Banco Central, substituindo títulos do Tesouro por dólares. Desta forma, a dívida passaria a ser com o FMI, e não com o BC, que teria suas reservas fortalecidas em dólares.
Segundo Caputo, a medida traria maior estabilidade à moeda local e fortaleceria o controle da inflação sem aumentar a dívida total do país. “[O dinheiro] não é para financiar gastos, nem para financiar déficits, mas para recapitalizar o ativo do Banco Central. O que nós buscamos com este acordo é que a gente possa ficar tranquila que, finalmente, os pesos tenham respaldo no BC”, disse o ministro.
A expectativa é elevar as reservas do BC argentino para US$ 50 bilhões. Atualmente, as reservas estão em cerca de US$ 26 bilhões. Em comparação, o Banco Central do Brasil encerrou 2024 com reservas de US$ 329,7 bilhões.
Alejandro Olmos Gaona questiona o argumento de que o novo empréstimo não aumenta os riscos, já que não eleva nominalmente a dívida do governo. “Não é o mesmo dever ao BC, que é da estrutura do Estado, que não faz exigências, não pede ajustes. Além disso, a dívida com o BC pode ser refinanciada permanentemente. Já o FMI estabelece condições muito restritas, exige regulamentações econômicas, monitorando e controlando a economia do país”, ponderou.
Olmos destacou que a dívida argentina está em torno de US$ 471 bilhões, com juros anuais de cerca de US$ 22 bilhões. O Brasil, por outro lado, possui a maior parte de sua dívida pública em reais, o que facilita o pagamento e refinanciamento. Para o especialista, o novo empréstimo não é sustentável, e defende uma estratégia para resolver o problema da dívida pública.
“O problema é que o poder econômico, os economistas, os teóricos, insistem que a única via possível para o desenvolvimento de um país é por meio do endividamento. Entendem que a única solução é seguir se endividando e, lamentavelmente, a história da Argentina demonstra que todos esses acordos com FMI sempre fracassaram”, disse o historiador.
Existe também a expectativa de que a exploração das reservas de petróleo e gás na região de Vaca Muerta impulsione a economia argentina, gerando receitas e atraindo dólares para o país. “O que passa é que são políticas conjunturais, não há planificação do Estado para um desenvolvimento sustentável”, finalizou Olmos.
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