Um fóssil controverso, conhecido como Cryptovaranoides microlanius, foi reanalisado por paleobiólogos e declarado o membro mais antigo do grupo lagarto-cobra. Essa criatura, cujo nome significa 'lagarto escondido, pequeno açougueiro', passou quase 70 anos em um depósito antes de ser estudada cientificamente.
Em 2022, cientistas da Universidade de Bristol realizaram um estudo aprofundado do esqueleto, posicionando-o dentro de Squamata, a ordem de répteis que engloba todos os lagartos e espécies de cobras. A datação do espécime, com pelo menos 202 milhões de anos, sugere que a origem do grupo remonta a um período 35 milhões de anos mais antigo do que se pensava.
Essa classificação inicial foi recebida com certa controvérsia. Em 2023, outra equipe de pesquisadores sugeriu que Cryptovaranoides não era um lagarto, nem mesmo um parente, mas sim um arquossauromorfo, um grupo mais próximo de crocodilianos e dinossauros. Michael Benton, paleontólogo de vertebrados, expressou sua surpresa diante dessa nova interpretação: “Ficamos surpresos, talvez até chocados, que em 2023 outra equipe de acadêmicos sugerisse que Cryptovaranoides não era um lagarto ou mesmo um parente de lagarto, mas na verdade um arquossauromorfo, mais intimamente relacionado a crocodilianos e dinossauros.”
Em um novo artigo, a equipe de Bristol abordou as preocupações dos críticos, utilizando raios-X, tomografias computadorizadas (TC) e análise filogenética para fornecer evidências adicionais que sustentam a conclusão original. Os resultados reafirmam que Cryptovaranoides é, de fato, um escamado, confirmando que o grupo remonta ao final do período Triássico. Benton afirma: “Todos os detalhes do crânio, das mandíbulas, dos dentes e dos ossos dos membros confirmam que Cryptovaranoides é um lagarto, não um arquossauromorfo”. A equipe forneceu fotos adicionais do espécime e imagens 3D de varreduras para que todos pudessem verificar os detalhes.
A disputa envolveu detalhes técnicos, mas os cientistas de Bristol responderam metodicamente às questões levantadas pela equipe liderada pelo biólogo evolucionista de Yale, Chase Brownstein. Eles iniciaram sua defesa abordando os principais erros de observação do fóssil cometidos pela equipe rival. Certos aspectos nos membros e crânio, que apontavam para um escamado, foram aparentemente negligenciados pela equipe de Brownstein, e os pesquisadores de Bristol os destacaram com novas imagens. Em seguida, analisaram uma série de características ósseas que corroboravam sua classificação original.
A principal refutação veio por meio da análise filogenética, que determina a posição de uma espécie na árvore evolutiva com base nas características compartilhadas com outros organismos. David Whiteside, geólogo de Bristol, explicou: “É aqui que codificamos centenas de características anatômicas em Cryptovaranoides e outros lagartos modernos e fósseis, bem como vários arquossauromorfos”.
Através desse processo, a equipe identificou três características cruciais que posicionam Cryptovaranoides na superordem Lepidosauria, que contém Squamata e não inclui arquossauromorfos. Dez características se encaixam dentro do clado Pan-Squamata e duas especificamente o colocam em Squamata. Finalmente, quatro características o localizam em Anguimorpha, uma subordem de escamados que inclui varanos, helodermas e dragões de komodo.
Os pesquisadores argumentam que, para classificá-lo em archosauromorpha, seria necessário rejeitar todas as características acima, alegando que as poucas indicações sugeridas pela equipe rival foram erros. Whiteside concluiu: “Realizamos a análise várias vezes e obtivemos nosso resultado original, de que o pequeno réptil de Bristol é de fato o lagarto moderno mais antigo do mundo.”
Essa pesquisa foi publicada na revista Royal Society Open Science. Independentemente do debate científico, esse humilde réptil viveu há 200 milhões de anos, sem imaginar a polêmica que sua descoberta provocaria.
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