A teoria da relatividade geral de Albert Einstein, embora revolucionária, apresenta lacunas. Roger Penrose, ganhador do Nobel de Física, demonstrou que o colapso gravitacional da matéria resulta em uma singularidade: um ponto de densidade e curvatura infinitas, onde as leis da física, como as conhecemos, deixam de existir.
Nesse ponto, espaço, tempo e matéria são esmagados e distorcidos até a inexistência, tornando a predição do futuro a partir do passado impossível, essencialmente inviabilizando a ciência tal qual a conhecemos. Penrose sugeriu uma possível solução: os buracos negros.
Um buraco negro possui um horizonte de eventos, uma membrana unidirecional no espaço-tempo. Objetos, inclusive a luz, que cruzam esse horizonte nunca mais podem retornar devido à imensa força gravitacional. Em todas as descrições matemáticas conhecidas de buracos negros, singularidades estão presentes em seu núcleo.
Penrose postulou que todas as singularidades do colapso gravitacional são 'vestidas' por horizontes de eventos de buracos negros, tornando-as inobserváveis. Com a singularidade contida dentro do horizonte de eventos, a física no restante do universo permanece inalterada. Essa conjectura, de que não existem singularidades 'nuas', é chamada de censura cósmica.
Após meio século, essa conjectura permanece sem comprovação e representa um dos maiores desafios da física matemática. A busca por exemplos que contradigam a conjectura também se mostrou infrutífera.
Um estudo recente, publicado na *Physical Review Letters*, sugere que a mecânica quântica, que governa o microcosmo de partículas e átomos, apoia a censura cósmica. Embora os buracos negros sejam influenciados pela mecânica quântica, esse impacto é normalmente ignorado pelos físicos. Por exemplo, Penrose excluiu esses efeitos em seu trabalho, assim como na teoria que permitiu a medição de ondas gravitacionais provenientes de buracos negros.
Ao considerar esses efeitos quânticos, os buracos negros são chamados de 'buracos negros quânticos', adicionando mais mistério à questão, pois não se sabe como a conjectura de Penrose se comporta no reino quântico. Um modelo onde matéria e espaço-tempo obedecem à mecânica quântica é considerado a descrição fundamental da natureza, possivelmente uma 'teoria de tudo' ou uma teoria da 'gravidade quântica'. Apesar dos esforços, uma teoria de gravidade quântica comprovada experimentalmente continua sendo difícil de obter.
Espera-se que qualquer teoria viável de gravidade quântica resolva as singularidades presentes na teoria clássica, mostrando que elas são um artefato de uma descrição incompleta. Portanto, é razoável esperar que os efeitos quânticos não agravem o problema de se observar uma singularidade.
O teorema de singularidade de Penrose assume que a matéria no universo sempre possui energia positiva. Entretanto, essa suposição pode ser violada mecanicamente pela quântica – sabe-se que pequenas quantidades de energia negativa podem existir no reino quântico (efeito Casimir).
Sem uma teoria completa de gravidade quântica, é difícil abordar essas questões. No entanto, progressos podem ser feitos considerando a gravidade 'semiclássica' ou 'parcialmente quântica', onde o espaço-tempo obedece à relatividade geral, mas a matéria é descrita pela mecânica quântica. Embora as equações da gravidade semiclássica sejam conhecidas, resolvê-las é outra questão. Nossa compreensão dos buracos negros quânticos é muito menos completa que a dos clássicos.
Sabemos que buracos negros quânticos também desenvolvem singularidades. Mas esperamos que uma generalização adequada da censura cósmica clássica, ou seja, a censura cósmica quântica, exista na gravidade semiclássica.
Ainda não existe uma formulação estabelecida da censura cósmica quântica, embora existam algumas pistas. Em alguns casos, uma singularidade nua pode ser modificada por efeitos quânticos para encobrir as singularidades; elas se tornam 'vestidas' pela quântica, porque a mecânica quântica desempenha um papel no horizonte de eventos. O primeiro exemplo foi apresentado por Roberto Emparan, Alessandro Fabbri e Nemanja Kaloper em 2002 (artigo científico). Todas as construções conhecidas de buracos negros quânticos compartilham essa característica, sugerindo que existe uma formulação mais rigorosa da censura cósmica quântica.
Intimamente ligada à censura cósmica está a desigualdade de Penrose, uma relação matemática que, assumindo a censura cósmica, afirma que a massa ou energia do espaço-tempo está relacionada à área dos horizontes de buracos negros contidos nele. Uma violação da desigualdade de Penrose sugeria fortemente uma violação da censura cósmica. Uma desigualdade de Penrose quântica poderia, portanto, ser usada para formular rigorosamente a censura cósmica quântica. Uma equipe de pesquisadores propôs tal desigualdade em 2019 (artigo científico). Embora promissora, sua proposta é muito difícil de testar para buracos negros quânticos em regimes onde os efeitos quânticos são fortes.
O estudo descobriu uma desigualdade de Penrose quântica que se aplica a todos os exemplos conhecidos de buracos negros quânticos, mesmo na presença de fortes efeitos quânticos. A desigualdade de Penrose quântica limita a energia do espaço-tempo em termos da entropia total – uma medida estatística da desordem de um sistema – dos buracos negros e da matéria quântica contida nele. A adição da entropia da matéria quântica garante que a desigualdade quântica seja verdadeira mesmo quando a versão clássica falha (em escalas quânticas). Que a energia total desse sistema não pode ser menor que a entropia total também é natural do ponto de vista da termodinâmica, para evitar uma violação da segunda lei da termodinâmica – que a entropia total nunca diminui.
Quando a matéria quântica é introduzida, sua entropia é adicionada à do buraco negro, obedecendo a uma lei generalizada. Em outras palavras, a desigualdade de Penrose também pode ser entendida como limites de entropia – exceder esse limite, e o espaço-tempo desenvolve singularidades nuas. Logicamente, não era óbvio que todos os buracos negros quânticos conhecidos satisfariam a mesma desigualdade universal, mas o estudo mostrou que sim. O resultado não é uma prova de uma desigualdade de Penrose quântica, mas o fato de que tal resultado se mantém no domínio quântico, assim como no clássico, o fortalece.
Enquanto o espaço e o tempo podem terminar em singularidades, a mecânica quântica esconde esse destino de nós.
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