O recente decreto presidencial que regulamenta o uso progressivo da força em operações policiais está alinhado com tratados internacionais já firmados pelo Brasil, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP). A entidade, que colaborou na elaboração da norma, enfatiza que a medida apenas reforça diretrizes que já constavam em documentos legais e acordos internacionais.
Entre os tratados e normas citados pelo FBSP estão o Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotado pela ONU em 1979; a Convenção Contra a Tortura e outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanas ou Degradantes da ONU, de 1984; e os Princípios Básicos sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei, de 1990, também da ONU. Adicionalmente, em 2010, o governo brasileiro editou a Portaria Interministerial 4.226/2010, que estabelece diretrizes sobre o uso da força por agentes de segurança. Em 2014, a Lei 13.060 regulamentou o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo por agentes de segurança em todo o país.
Segundo o FBSP, o Decreto 12.341/2024, ao regulamentar normas já existentes, coloca o Brasil em conformidade com seus compromissos legais internacionais. O decreto estabelece que o uso de armas de fogo deve ser a última opção, priorizando a prevenção da violência policial e abusos. A norma também define que armas só devem ser usadas quando outros recursos de menor intensidade forem insuficientes para alcançar os objetivos legais. Um ponto específico da norma proíbe o uso de armas contra pessoas desarmadas em fuga, inclusive em veículos, a menos que representem risco para os agentes ou terceiros.
Violência Policial e a Necessidade de Regulamentação
A publicação do decreto ocorreu em meio a recentes episódios de violência policial. Um deles, na Rodovia Washington Luís (BR-040), na Baixada Fluminense, resultou no ferimento grave de Juliana Leite Rangel, de 26 anos, atingida por um tiro na cabeça disparado por policiais rodoviários federais. Segundo o pai de Juliana, Alexandre Silva Rangel, os policiais atiraram no carro da família sem aviso prévio, durante uma viagem para celebrar o Natal. Em outro incidente, um jovem de 24 anos foi baleado à queima-roupa por um policial militar em São Paulo, enquanto filmava uma ação de desobstrução de rua. Em ambos os casos, os agentes envolvidos foram afastados e inquéritos foram instaurados para apurar as responsabilidades.
O FBSP destaca que esses casos demonstram a urgência de estabelecer diretrizes e procedimentos nacionais para regulamentar o uso da força. "Os episódios recentes envolvendo a Polícia Rodoviária Federal […] e o caso do jovem de 24 anos baleado à queima roupa por um Policial Militar […] são exemplos fáticos da necessidade de se estabelecer diretrizes e procedimentos nacionais que regulem o uso da força em território nacional", afirma a entidade.
Condenações Internacionais e Reações de Governadores
O Brasil já foi condenado pela Corte Interamericana de Direitos Humanos por uso abusivo da força pelas polícias do Rio de Janeiro e de São Paulo. O Fórum Brasileiro de Segurança Pública critica ainda as declarações de governadores como Ronaldo Caiado, de Goiás, e Claudio Castro, do Rio de Janeiro, que manifestaram oposição ao decreto presidencial, sugerindo até recorrer contra ele. O Fórum defende que a regulamentação dos tratados internacionais é atribuição exclusiva da União e não uma invasão de competências estaduais.
O FBSP argumenta que "Cabe à União cumprir as decisões da Corte Interamericana de Direitos Humanos, que determinam a edição de regras de uso da força. Por isso, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública entende que, ao contrário de declarações de alguns governadores contra a edição do Decreto 12.341, a atribuição de regulamentação dos tratados internacionais aos quais o Brasil é signatário, fato que só ocorre após a aprovação pelo Congresso Nacional, é atribuição exclusiva da União e não configura usurpação e/ou invasão de competências dos estados e do Distrito Federal em matéria de Segurança Pública".
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