O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação civil pública com o objetivo de garantir a participação da comunidade tradicional local nas decisões referentes ao Complexo Turístico da Redinha, em Natal. A ação busca também a suspensão do projeto de concessão do empreendimento à iniciativa privada.
O Complexo Turístico da Redinha, que engloba o antigo Mercado da Redinha, foi reaberto temporariamente em 6 de fevereiro, após negociações entre comerciantes e a prefeitura, depois de ter sido inaugurado em dezembro e fechado em janeiro. No entanto, uma nova previsão de fechamento está marcada para esta segunda-feira (10). A prefeitura pretende lançar um novo edital de concessão à iniciativa privada, tendo em vista que o primeiro não atraiu empresas interessadas.
De acordo com o MPF, a prefeitura aprovou a concessão da gestão da área à iniciativa privada sem consultar a população local. A ação ressalta que “ribeirinhos, pescadores artesanais, marisqueiras, barraqueiros e pequenos comerciantes, historicamente vinculados ao território, sofrem sem sua fonte de subsistência“.
O procurador da República Camões Boaventura, autor da ação, argumenta que intervenções em áreas de relevante valor étnico e social não podem ocorrer sem a garantia dos direitos das populações que habitam o local há gerações.
“Buscamos reafirmar o dever do poder público em promover o desenvolvimento sustentável e inclusivo, preservando a integridade da comunidade e seu modo de vida“, defendeu Boaventura.
O que pede a ação do MPF:
- Que a Justiça Federal determine, em caráter de urgência, que o município de Natal não adote qualquer nova medida administrativa ou legislativa referente à Redinha, sem a realização de Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) à comunidade tradicional local;
- A imediata suspensão da Lei Municipal 7.74/24, que regulamenta a concessão do Complexo Turístico da Redinha à iniciativa privada;
- Pagamento de indenização pelos danos morais coletivos causados à população.
As obras do Complexo Turístico da Redinha incluem o mercado público, os quiosques da praia e o espaço de guarda, entrada e saída de embarcações. Segundo o MPF, os quiosques antes existentes foram demolidos e permaneciam pendentes da construção das novas instalações até este mês de março. A reforma do mercado foi concluída após vários atrasos e “sem o consenso da comunidade nem a devida assistência aos comerciantes desalojados“.
A prefeitura de Natal se manifestou por meio de nota, informando que recebeu a ação com “estranheza”, questionando a aplicação da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e tribais aos quiosqueiros. A prefeitura também questiona o motivo de se ouvir a comunidade após a conclusão da obra e defende que “o equipamento a ser licitado à iniciativa privada trará mais prosperidade para região“.
O MPF concluiu que as obras realizadas no mercado têm gerado “impactos dramáticos na subsistência, saúde, modos de vida e dignidade dessa comunidade”. A ação se baseia em laudo antropológico do MPF e em relatório técnico do Centro de Referência em Direitos Humanos Marcos Dionísio, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
De acordo com o laudo, a Redinha é composta por comunidades tradicionais, que “se entrelaçam em história, parentescos e atividades produtivas”, sendo elas: a comunidade de pescadores, a comunidade África e a comunidade ribeirinha do mercado público. As relações de parentesco e comunidade se manifestam nos costumes, nas tradições religiosas, nas organizações coletivas, nos conhecimentos específicos transmitidos por gerações e na interdependência econômica relacionada à pesca.
A realização de Consulta Prévia, Livre e Informada (CPLI) às comunidades tradicionais sobre intervenções em seus territórios está prevista na Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Povos Indígenas e tribais, da qual o Brasil é signatário. O procurador da República Camões Boaventura explicou que a CPLI “deve ser culturalmente adaptada para alcançar seus objetivos, o que implica a necessidade de que os povos consultados compreendam plenamente o processo“.
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