Mais de 8.500 naufrágios de ambas as Guerras Mundiais repousam no fundo dos oceanos, representando uma ameaça ambiental significativa e uma bomba-relógio em potencial. Esses destroços submersos abrigam uma quantidade estimada de 6 bilhões de galões de petróleo, além de munições, metais pesados tóxicos e até mesmo armas químicas.
Degradação e o papel das mudanças climáticas
Por décadas, esses destroços permaneceram esquecidos, mas a degradação estrutural deles aumenta inexoravelmente o risco de liberação súbita de substâncias tóxicas no meio ambiente marinho. A situação é agravada pelas mudanças climáticas, com o aumento da temperatura da água, a acidificação oceânica e a maior frequência de tempestades acelerando a deterioração dessas embarcações. O custo estimado para lidar com esse problema global chega a US$ 340 bilhões. Os custos do combate às mudanças climáticas podem quadruplicar com demora, alertam especialistas, tornando a resolução desse problema ainda mais urgente.
Mapeamento impreciso e desafios na identificação de riscos
Embora dados numéricos e mapas indiquem a dimensão do problema, a realidade é mais complexa. Aproximadamente 23% dos oceanos foram mapeados detalhadamente, mas esse nível de detalhamento muitas vezes é insuficiente para identificar positivamente um naufrágio e determinar o risco que ele representa. O projeto Seabed 2030 busca melhorar o mapeamento, mas mesmo uma resolução de 100×100 metros por pixel não revelará todos os detalhes escondidos em áreas tão extensas. Muitos naufrágios problemáticos estão em águas costeiras rasas, onde há mapeamento de alta resolução, mas a identificação precisa permanece desafiadora.
Registros históricos, como os mantidos pela Lloyd's Register Foundation, em Londres, são essenciais. Esses arquivos contêm informações sobre as estruturas dos navios, cargas transportadas e últimas posições conhecidas. No entanto, a precisão dessas posições é variável, dificultando a localização exata dos destroços. Pesquisas de Innes McCartney e Mike Roberts no Mar da Irlanda demonstraram que naufrágios são frequentemente mal atribuídos e mal localizados, com até 60% deles em locais desconhecidos no fundo do mar.
Uma corrida contra o tempo: impactos da atividade humana e desafios legais
A maioria dos naufrágios preocupantes é de metal ou de construção mista metal-madeira. A degradação do aço aumenta o risco de derramamento de cargas e quebra de componentes. A intensificação da pesca e a construção de parques eólicos offshore aumentam ainda mais os riscos, podendo causar distúrbios físicos nos locais dos naufrágios. A responsabilidade pela limpeza é um grande desafio, pois muitos naufrágios estão em águas de países sem ligação com o proprietário original. O conceito de imunidade soberana impede que o Estado da bandeira do navio (país onde o navio estava registrado) seja responsabilizado legalmente e obrigue o pagamento pelo processo de limpeza.
Tecnologias e parcerias internacionais: caminho para a solução
Para avaliar a condição dos naufrágios e determinar a necessidade de intervenção, são necessárias contribuições de historiadores, arqueólogos, engenheiros, biólogos, geofísicos, geoquímicos, agrimensores hidrográficos, analistas de dados geospaciais e outros profissionais. Projetos regionais já demonstram o que pode ser alcançado, mas a escala do problema é imensa. Veículos subaquáticos autônomos (AUVs), equipados com sensores para medir o fundo do mar e detectar poluentes, podem melhorar nosso conhecimento sobre a localização e condição dos destroços, oferecendo dados de alta resolução a um custo menor do que pesquisas em grandes embarcações. A troca de informações entre instituições e empresas é fundamental para acelerar o avanço do conhecimento, evitando a compartimentalização de dados. A iniciativa global Project Tangaroa busca criar um arcabouço regulatório e de financiamento para enfrentar esse problema, porém, é necessária determinação política e recursos financeiros para que se torne realidade. A gravidade da situação se compara aos desafios apresentados pelo Ártico sem gelo, que pode ocorrer ainda nesta década.
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