Congresso aprova pacote que deve custar R$ 106 bilhões ao bolso dos brasileiros

O retrato que se forma no Congresso Nacional não é apenas o de uma casa legislativa poderosa: é o de uma estrutura que sabe expandir despesas e blindar seus próprios privilégios.
Congresso aprova pacote que deve custar R$ 106 bilhões ao bolso dos brasileiros
Marcello Casal Jr / Agência Brasil

O Congresso Nacional avançou com uma série de medidas que vão gerar um impacto direto de R$ 106,9 bilhões nas contas públicas apenas em 2025. Esse movimento vem ampliando o custo fiscal do país no momento em que o governo tenta reforçar a arrecadação e equilibrar as finanças.

A imagem que se impõe no cenário político é clara: o Congresso tem assumido um protagonismo que desafia o controle do Executivo. A fotografia do Congresso Nacional, com sua imponência arquitetônica, representa um poder que hoje dita parte relevante das decisões que pesam sobre o Orçamento da União.

Segundo levantamento da Tendências Consultoria, solicitado pelo jornal O Globo, o custo das decisões recentes do Legislativo não para em 2025. A projeção é que a fatura alcance R$ 123,25 bilhões em 2026, principalmente devido ao impacto do aumento de deputados federais, de 513 para 531 parlamentares, e pela sanção do Propag, o programa de renegociação das dívidas dos estados.

Esse último projeto, proposto pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), praticamente eliminou os juros das dívidas estaduais, deixando apenas a correção pela inflação. O impacto financeiro do Propag é estimado em R$ 20 bilhões por ano a partir de 2026.

O peso das emendas parlamentares

Outro ponto que pressiona os cofres públicos é o aumento contínuo das emendas parlamentares. Em 2014, o valor destinado a essas emendas era de R$ 8,6 bilhões. Este ano, o volume alcançou R$ 62 bilhões.

O economista Bráulio Borges, da FGV/Ibre, defende que reduzir as emendas para um patamar mais próximo de práticas internacionais — cerca de R$ 10 bilhões anuais — seria suficiente para equilibrar as contas públicas.

Para Borges, há um desequilíbrio de responsabilidades. O Congresso, fortalecido pelo volume de emendas, exerce poder sobre o orçamento, mas transfere ao governo federal a pressão por ajustes:

Há peso excessivamente carregado pelo Executivo federal. Essa responsabilidade tem de ser compartilhada“, afirma.

Mais deputados, mais gastos

Com a decisão já aprovada de ampliar o número de deputados federais, o Congresso criará 18 novas cadeiras a partir de 2026.

O cientista político Carlos Melo, do Insper, estima que esses novos parlamentares custarão R$ 165 milhões por ano. Segundo ele, além do salário, os novos deputados vão exigir o mesmo espaço orçamentário, privilégios e controle de emendas que os atuais parlamentares já possuem.

O professor também destaca que, com o aumento de recursos do fundo partidário e do fundo eleitoral, os congressistas ganharam autonomia para recusar cargos no Executivo:

Eles não dependem do governo. São cinco centenas de vereadores federais“, critica.

‘Jabutis’ e medidas que pressionam o consumidor

O Congresso também aprovou “jabutis” no setor elétrico — dispositivos incluídos em um projeto que originalmente não tratava do tema — com custo estimado superior a R$ 190 bilhões, segundo Borges. O valor será repassado diretamente à conta de energia dos consumidores.

Outro exemplo é a manutenção do Perse, programa criado para isentar o setor de eventos durante a pandemia. O governo tentou extingui-lo, mas o Congresso manteve a isenção, com impacto fiscal superior a R$ 15 bilhões.

Além disso, a desoneração da folha de pagamento, criada ainda no governo Dilma Rousseff e limitada a 17 setores, foi prorrogada. O Supremo Tribunal Federal (STF) cobrou compensação pela perda de arrecadação — estimada em R$ 20 bilhões — mas o Congresso apresentou apenas R$ 9 bilhões em receitas pontuais, sem garantia de continuidade.

Impacto da isenção no Imposto de Renda

O debate sobre a isenção do Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil segue em aberto, mas a proposta apresentada pelo Partido Progressistas (PP) pode elevar a renúncia fiscal.

O plano adia a aplicação da alíquota mínima sobre rendas mais altas, começando a cobrança apenas a partir de R$ 250 mil por mês. O impacto estimado desse modelo seria um déficit fiscal adicional de R$ 38 bilhões.

Para Ricardo Ribeiro, analista político da LCA 4Intelligence, o foco do Congresso é a preparação para as eleições de 2026. Segundo ele, o debate sobre controle de gastos cede espaço a interesses eleitorais e fortalecimento de alianças políticas regionais:

O essencial é que estamos antevendo o embate eleitoral de 2026“, afirma.

O Congresso tem ampliado gastos, flexibilizado regras e aumentado o próprio poder sobre o Orçamento da União. O Executivo tenta conter o rombo, mas esbarra em um Legislativo que já não precisa mais de cargos para exercer influência.

Hoje, as emendas, os fundos e o crescimento das bancadas sustentam o poder político de quem ocupa a Câmara e o Senado.

O impacto de R$ 106,9 bilhões só neste ano — e a expectativa de R$ 123 bilhões em 2026 — não é um detalhe técnico: é o preço da disputa por espaço e da ausência de controle efetivo sobre o ciclo de gastos.

O retrato que se forma no Congresso Nacional não é apenas o de uma casa legislativa poderosa: é o de uma estrutura que sabe expandir despesas e blindar seus próprios privilégios.

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