“Bons Meninos” chega à Netflix e vira opção certeira para rir e refletir

Bons Meninos não reinventa o gênero, mas entrega com competência e estilo um pedaço do que todos nós já fomos. E só por isso, já vale o play.
“Bons Meninos” chega à Netflix e vira opção certeira para rir e refletir
Bons Meninos na Netflix

Vi Bons Meninos (Good Boys) pela primeira vez quando estreou em 2019, mas revisitá-lo agora pela Netflix me fez enxergar nuances que talvez a pressa da época não tenha deixado perceber. Por trás das piadas escatológicas, dos brinquedos sexuais confundidos com itens de casa e das fugas alucinadas por drones perdidos, existe ali um retrato hilário – e melancólico – da última fase antes do colapso hormonal.

Produzido por Seth Rogen e Evan Goldberg, a dupla que já transformou a comédia juvenil em uma máquina de constrangimentos memoráveis, Bons Meninos tem a direção de Gene Stupnitsky, estreante que veio da TV (The Office) e soube equilibrar caos e candura com mais acerto do que muitos veteranos.

A premissa é simples, quase boba: Max, Lucas e Thor – três garotos de 12 anos – precisam substituir o drone destruído do pai de Max antes que ele perceba o estrago. Mas esse ponto de partida logo vira um turbilhão que envolve adolescentes mais velhos, traficantes, bonecas infláveis, policiais e até um pouco de existencialismo. Tudo isso sem que o trio realmente entenda o que está fazendo – o que é justamente o coração do filme: a confusão de crescer sem ter noção do que significa crescer.

Revendo o filme hoje, o que mais salta aos olhos não são apenas as situações absurdas ou o ritmo alucinante das cenas, mas a forma como ele trata a perda da inocência. Os três protagonistas, vividos com carisma por Jacob Tremblay, Keith L. Williams e Brady Noon, estão no limiar entre brincar de Nerf e tentar entender o que é “dar um beijo de língua”. E isso, por mais engraçado que soe, é genuinamente comovente.

Bons Meninos arranca risadas porque é cruelmente honesto. Mostra o quanto a pré-adolescência é um campo minado de descobertas precoces, amizades em transição e mal-entendidos sobre o mundo adulto. A sequência em que eles tentam vender “brinquedos” para conseguir dinheiro é grotesca e ao mesmo tempo singela. O mundo, aos olhos deles, ainda é um lugar cheio de significados mal explicados, o que torna tudo ainda mais engraçado – e mais humano.

É claro que estamos falando de uma comédia de humor mais direto e classificação para maiores de 14, mas isso não impede o filme de ser absurdamente verdadeiro para todas as idades. E talvez esse seja seu maior mérito: não subestimar a inteligência de seus pequenos personagens nem do público que os assiste.

O roteiro é redondo, os diálogos têm timing afiado, e a trilha sonora embala muito bem as cenas mais insanas. O filme passou razoavelmente bem nos cinemas (com US$ 111 milhões de bilheteria mundial frente a um orçamento de US$ 20 milhões), mas ganhou uma segunda vida no streaming, onde parece ter encontrado um público ainda mais fiel – especialmente entre os que viveram (ou vivem) a angústia e a comicidade de ser um “pré-adolescente em crise”.

Não é um filme para ver com crianças – apesar dos protagonistas – e também não é uma comédia rasa para rir e esquecer. É o tipo de história que transforma a vergonha alheia em identificação. Que faz você lembrar do primeiro beijo, do primeiro fora, da primeira vez que você se deu conta de que não era mais criança. E rir disso tudo é quase terapêutico.

Bons Meninos não reinventa o gênero, mas entrega com competência e estilo um pedaço do que todos nós já fomos. E só por isso, já vale o play.

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