O Congresso Nacional derrubou nesta terça-feira (17) parte dos vetos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a um projeto de lei que, originalmente, tratava do incentivo à geração de energia eólica offshore — aquela gerada no mar. No entanto, dispositivos estranhos ao tema principal, conhecidos como jabutis legislativos, foram inseridos no texto por parlamentares e agora voltam a vigorar com força de lei.
Com a derrubada dos vetos, entidades do setor elétrico alertam para impactos diretos nas tarifas de energia, estimando que a conta de luz pode subir até 3,5%. O custo total das medidas validadas chega a R$ 197 bilhões até 2050, de acordo com levantamento técnico da PSR Consultoria, em conjunto com a Frente Nacional dos Consumidores de Energia (FNCE) e a Abrace Energia.
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Os principais pontos retomados pela derrubada dos vetos envolvem obrigações de contratação e prorrogação de contratos no setor elétrico, sem que haja, segundo as entidades, justificativa técnica ou compatibilidade com a demanda atual do sistema. Veja abaixo o detalhamento:
1. Contratação obrigatória de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs)
- Impacto estimado: R$ 140 bilhões até 2050
- O projeto exige a contratação compulsória de 4,9 GW em PCHs, independentemente da necessidade ou do planejamento do setor.
- Segundo nota das associações, a medida pode gerar sobrecarga de energia no sistema e ampliar o desperdício de produção de fontes renováveis, como solar e eólica.
2. Produção de hidrogênio líquido e eólicas regionais
- Impacto estimado: R$ 33 bilhões
- R$ 28 bilhões correspondem à contratação de hidrogênio líquido derivado do etanol no Nordeste.
- R$ 5 bilhões dizem respeito à contratação compulsória de energia eólica na Região Sul, fora dos critérios de eficiência técnica e econômica.
3. Prorrogação de contratos do Proinfa por 20 anos
- Impacto estimado: R$ 24 bilhões
- Os contratos do Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica (Proinfa) seriam estendidos por duas décadas, mesmo com custos acima da média do setor.
Ao todo, os três pontos retomados pela derrubada do veto representam um impacto conjunto de R$ 197 bilhões até 2050 — valor que será absorvido diretamente na tarifa paga pelo consumidor final, segundo os cálculos das entidades especializadas.
O que ainda falta ser votado pelo Congresso
A derrubada parcial dos vetos não encerra a discussão. Ainda há trechos pendentes que podem ser votados em sessões futuras. Caso também sejam retomados, o impacto pode saltar para R$ 545 bilhões em custos até 2050, resultando em aumento de até 9% na conta de energia para residências, comércios e indústrias.
Os dispositivos que ainda aguardam deliberação incluem:
- Extensão do uso de usinas a carvão: impacto de R$ 92 bilhões
- Obrigação de contratação de térmicas a gás: R$ 155 bilhões
- Manutenção dos subsídios à energia solar distribuída: R$ 101 bilhões
Esse pacote de medidas, segundo nota técnica enviada ao governo em 2023, já foi duramente criticado por 12 associações do setor, que alertaram para o risco de distorção no equilíbrio do sistema elétrico e no encarecimento em cadeia de bens e serviços.
Reação do setor: “Caos no sistema elétrico”
O presidente da FNCE, Luiz Eduardo Barata, afirmou que a derrubada dos vetos ocorreu de forma inesperada e sem aviso aos grupos técnicos que acompanham o tema.
“Confiamos na sinalização de que isso só seria votado em agosto, mas a decisão foi antecipada. Esse tipo de energia imposta não é necessária agora. O impacto vai direto para a conta de luz do cidadão e gera um efeito cascata sobre comércio e serviços”, disse.
A FNCE informou que estuda entrar com ação no Supremo Tribunal Federal (STF) para questionar os trechos aprovados. Em nota oficial, a frente declarou:
“O Congresso torna-se responsável pelo aumento na conta de luz dos brasileiros e por instalar o caos definitivo no setor elétrico. A lei criada para fomentar a energia eólica offshore acabará ampliando os cortes de geração solar e eólica já instalada, inclusive as futuras plantas no mar.”
Entenda o conceito de jabuti legislativo
O termo jabuti é utilizado no meio parlamentar para se referir a artigos que são inseridos em projetos de lei, mas que não guardam relação direta com o tema original. No caso, o projeto tratava exclusivamente de diretrizes para viabilizar a energia eólica no mar. A inclusão de obrigações de contratação e prorrogações contratuais foi vista como instrumentalização política para beneficiar setores específicos, segundo as entidades técnicas.