‘Cheque especial’ do Governo deve ser uma das medidas para ressarcir vítimas do INSS

‘Cheque especial’ do Governo deve ser uma das medidas para ressarcir vítimas do INSS
Agência GOV

A série de irregularidades envolvendo o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e entidades sindicais investigadas pela Polícia Federal pode resultar em uma medida emergencial para reembolsar aposentados e pensionistas prejudicados por descontos não autorizados. A estimativa é de que o valor total ultrapasse R$ 6 bilhões, atingindo cerca de 4,1 milhões de beneficiários da Previdência Social.

O escândalo ganhou mais repercussão após a revelação de que a Confederação Nacional de Agricultores Familiares e Empreendedores Familiares Rurais (Conafer), uma das organizações sob investigação, sofreu 28 condenações na Justiça em apenas sete dias. Com isso, cresce a pressão por uma resposta do Governo Federal, que já avalia mecanismos legais e orçamentários para devolver os valores retidos indevidamente.

O advogado especialista em Direito Previdenciário, Washington Barbosa, que também é mestre em Direito das Relações Sociais e Trabalhistas e CEO da WB Cursos, afirma que a responsabilidade recai sobre o próprio INSS. Em entrevista concedida ao Portal N10, ele avalia que a restituição terá de ocorrer por meio de medidas administrativas, jurídicas e orçamentárias.

Segundo Barbosa, a atuação da Advocacia-Geral da União (AGU) em conjunto com o INSS já indica a intenção do governo em acionar entidades suspeitas, mas reforça que o problema é de grande escala. “Se deveria, na verdade, acionar todas essas pessoas para que elas digam se esse débito é real, se foi realmente autorizado ou não”, explica o especialista.

Caso o beneficiário alegue que o desconto é indevido, o Estado deve instaurar processo administrativo contra a entidade, conforme prevê a legislação. “Há de se acionar a entidade para que a ela tenha direito à ampla defesa e o contraditório, nos termos da lei do processo administrativo federal, para que se defenda, traga documentos, traga informações que possam confirmar que aquele débito havia sido autorizado. Isso aí é um trabalho imenso e que não sai de um dia para a noite”.

Barbosa ainda destaca que o INSS, além de ter responsabilidade subsidiária, tem responsabilidade solidária pelo ocorrido. “No meu ponto de vista, o que é que o governo deve fazer? Em primeiro lugar, é bom deixar claro que há responsabilidade do INSS nisso. No mínimo, a responsabilidade subsidiária. Ou seja, haveria de se acionar a entidade. Se a entidade não pagar, o INSS seria responsável”.

Ele completa: “A meu ver, a responsabilidade é solidária, tanto da entidade quanto do INSS, porque ambos viabilizaram esse débito indevido. Quando a responsabilidade é solidária, você pode cobrar de um ou de outro. Lógico, as pessoas vão acabar cobrando do governo que tem maior condição de pagar”.

Diante da falta de recursos previstos no orçamento, o governo estuda recorrer ao chamado crédito extraordinário, mecanismo emergencial autorizado por medida provisória. “O governo não tem de onde tirar esses recursos, mas existe uma solução que se chama de crédito extraordinário. O que é esse crédito extraordinário? É um cheque especial que o governo tem por meio de uma medida provisória”, detalha Barbosa.

Esse tipo de crédito permite a liberação imediata dos recursos após publicação da medida, mesmo antes da aprovação pelo Congresso. “Em situações de urgência e imprevisibilidade, pode ser aberto um crédito extraordinário fora do orçamento. Isso é feito por meio de uma medida provisória e essa medida provisória é encaminhada para o Congresso e as duas casas têm de se manifestar em cima disso. Mas, a partir do momento que a medida provisória é publicada, os recursos já podem ser utilizados”, completa.

Além disso, Barbosa acredita que será necessário estruturar um programa específico: “Paralelamente, eu acho que o governo vai lançar uma outra medida provisória criando um programa de ressarcimento para os aposentados e pensionistas, e nesse programa ele vai estabelecer as condições de pagamento. Então essa seria, a meu ver, uma das poucas soluções do governo para fazer isso”.

Mesmo reconhecendo a importância do ressarcimento, o especialista alerta que o ônus cairá sobre a população. “Na verdade, os pagadores de impostos vão arcar com essas despesas duas vezes. Nós arcamos com as despesas, nós demos os recursos para o pagamento de benefícios. Esse dinheiro foi desviado e agora nós vamos novamente pagar esses valores, os pagadores de impostos, duas vezes, pagando exatamente a mesma coisa”.

Na visão dele, a medida representa uma distorção do uso de recursos públicos. “Há de se deixar claro que, na verdade, isso vai significar uma transferência de recursos dos pagadores de impostos para os sindicatos e entidades”.

A advogada Renata Abalém, Diretora Jurídica do Instituto de Defesa do Consumidor e do Contribuinte (IDC) e membro da Comissão de Direito do Consumidor da OAB/SP, explica que o primeiro passo para o segurado é conferir o extrato de pagamento pelo site ou aplicativo Meu INSS. “Em primeiro lugar, verificar no extrato de pagamento se existe o desconto indevido e sob qual rubrica ele está ocorrendo. É importante, para fins de reembolso, que o beneficiário saiba desde quando os descontos ocorrem e se houve variação de valores, além de saber qual entidade é a responsável”.

Ela também alerta para riscos de golpes: “Toda e qualquer situação relacionada à suspensão do desconto ou pesquisa de valores descontados, deve ser feita pelos canais oficiais e a senha não deve ser transferida para ninguém.

Caso confirmado o desconto indevido, o cidadão pode pedir a exclusão da cobrança, fazer reclamação no INSS pelo número 135 ou mesmo buscar o Judiciário. “Não havendo a suspensão do desconto imediatamente, o segurado pode ajuizar ação na justiça para impedir o desconto, e ainda mais, para reaver seu dinheiro. Esse reembolso, de acordo com o CDC, pode se dar em dobro e o beneficiário, a depender da sua situação, pode postular indenização por danos morais”, destaca.

Renata finaliza com uma orientação direta: “Se por acaso o beneficiário pretender entrar na Justiça, que procure um advogado de sua confiança e não forneça informações por telefone”.

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