A gestão do prefeito Allyson Bezerra (União Brasil) em Mossoró continua sendo vendida como uma revolução administrativa. É jovem, articulado, presente nas redes sociais e incansável na agenda pública. Seu nome é, hoje, um dos mais fortes do interior do Rio Grande do Norte e um provável player em disputas futuras além do executivo municipal.
Com presença constante nas redes sociais, vídeos diários em obras e forte apelo popular, o prefeito reeleito em 2024 com 78,02% dos votos parece caminhar com folga. Mas, à medida que a poeira da eleição baixa e a cidade segue cobrando resultados, cresce a distância entre a imagem projetada e a realidade administrativa.
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A política da hiperexposição tem seus méritos: garante aprovação alta. Pesquisa da TCM/TS2 divulgada em março apontou que 86,1% dos mossoroenses aprovam a atual gestão. Mas, como a própria história política já mostrou tantas vezes, aprovação não é blindagem. E política não se mede só por likes, nem por porcentagens em enquetes.
O rombo fiscal que não aparece no feed
O primeiro ponto sensível da gestão Allyson é a saúde fiscal. Ao final de seu primeiro mandato (2021–2024), o município acumulou um “resto a pagar” de R$ 198,2 milhões, segundo o Tribunal de Contas do Estado (TCE-RN). O valor representa cerca de 14% do orçamento total da cidade em 2025.
É um número que chama atenção por si só — mas ganha contornos ainda mais delicados quando se observa que a gestão anterior, de Rosalba Ciarlini, deixou R$ 94 milhões em restos a pagar, e foi duramente criticada por isso.
A diferença é que agora, o discurso oficial tenta relativizar. A defesa da gestão é que os débitos são “administráveis” e parte de um planejamento. Mas a ausência de detalhamento público sobre o cronograma de pagamento, a origem dos recursos e o impacto em áreas como saúde, educação e obras levanta alertas.
Restos a pagar dessa magnitude impactam diretamente a capacidade de investimento da cidade. Eles travam novos contratos, engessam áreas importantes e forçam cortes em setores que hoje já operam sob pressão. Em uma cidade como Mossoró, com demandas acumuladas, esse volume de dívida flutuante não pode ser normalizado.
O caso Nogueirão: promessa, recuo e silêncio
Durante a campanha, Allyson prometeu revitalizar o Estádio Leonardo Nogueira, o tradicional Nogueirão. A população esportiva da cidade comprou a ideia. No entanto, em 2024, o estádio foi fechado por decisão judicial, após o não cumprimento de um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público para adequação da estrutura.
Diante do impasse, o prefeito chegou a propor uma permuta do terreno com a iniciativa privada, o que permitiria a construção de uma nova arena em outro local. A reação foi imediata. Torcedores, ex-jogadores e líderes comunitários cobraram o cumprimento do prometido. O governo recuou e anunciou que o Nogueirão será reconstruído no mesmo local.
Passados meses do novo anúncio, nenhuma etapa concreta da reconstrução foi tornada pública. A dúvida permanece: o estádio será de fato recuperado ou continuará como uma ferida aberta no centro da cidade?
Segurança e saúde nas UPAs: ponto positivo
Um avanço real, reconhecido inclusive por servidores da saúde, foi a ampliação do patrulhamento da Guarda Civil Municipal nas UPAs de Mossoró. Desde março, as unidades contam com patrulhamento 24h, o que tem ajudado a reduzir situações de violência e melhorar o ambiente de trabalho dos profissionais da rede.
Também há progresso na construção da Policlínica do bairro Alto de São Manoel, que está com mais de 60% das obras concluídas. A unidade deve reforçar a oferta de atendimentos especializados, descentralizando a demanda dos principais pontos da rede de atenção.
Esses dois pontos são méritos da gestão — mas não compensam, sozinhos, os gargalos persistentes em UBSs, na regulação e na baixa cobertura de Estratégias de Saúde da Família.
Comunicação institucional: a face mais polida do governo
Poucos prefeitos no Brasil dominam a arte da autopromoção como Allyson Bezerra. Desde o início do mandato, a gestão investiu pesado em comunicação institucional. Segundo levantamento publicado pelo site Na Boca da Noite, foram quase R$ 14 milhões em publicidade entre 2021 e 2024.
Grande parte desses recursos foi destinada a veículos alinhados à imagem do prefeito, inclusive blogs e perfis que atuam como porta-vozes não oficiais do governo. Por outro lado, veículos que fazem cobertura crítica ou independente foram excluídos da distribuição de verbas. Isso levanta dúvidas não só sobre isonomia, mas sobre o uso de dinheiro público para moldar o debate público.
Publicidade oficial não é problema — o problema é quando ela vira escudo e tenta apagar a necessidade de prestação de contas real.
Obras que duram menos que o ciclo político
A oposição na Câmara tem denunciado a má qualidade de algumas obras entregues pela Prefeitura. O vereador Jailson Nogueira (PL) afirmou que “fazem, inauguram e logo têm que reformar”. Em março, denúncias sobre infiltrações em equipamentos recém-entregues se espalharam. A gestão preferiu ignorar — como se o silêncio apagasse a fissura no concreto.
O brilho não segura a estrutura
A gestão Allyson Bezerra é eficiente em narrativa, firme em imagem e hábil em articulação popular. Mas os pilares da administração começam a ranger quando confrontados com números, prazos e promessas ainda não cumpridas.
A cidade quer mais do que presença em vídeo. Quer resultado durável. Quer escola com merenda, UBS funcionando à noite, estádio liberado para o povo e contas públicas transparentes. E quer, acima de tudo, um prefeito que não apenas comunique — mas que cumpra.