Bilhões de reais foram subtraídos de forma sistemática do bolso de aposentados e pensionistas do INSS no Brasil. Mas por que não há revolta?
Não houve panelaço. Nenhuma passeata. Nenhuma faixa empunhada nas ruas. Ainda assim, mais de R$ 6,3 bilhões podem ter sido retirados, sem autorização, do contracheque de aposentados e pensionistas do INSS ao longo dos anos. A denúncia é pública, foi reconhecida pelo próprio Instituto Nacional do Seguro Social, e já motivou mais de 1,3 milhão de pedidos de reembolso — número que não para de crescer. E, mesmo assim, o país segue indiferente.
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É como se lesar idosos pobres tivesse se tornado normal.
As vítimas são, em sua maioria, cidadãos que recebem um salário mínimo e que, ao longo da vida, contribuíram com suor e trabalho para ter um mínimo de dignidade na velhice. São aposentados que descobriram, com surpresa, descontos em seus extratos para associações das quais nunca ouviram falar. Descontos que, em muitos casos, somam mais de R$ 60 por mês — valor que, para quem vive no limite, faz falta na farmácia, no mercado, no aluguel. A fraude foi longa, organizada e, até hoje, pouco investigada.
Relatos apontam que os descontos ocorrem desde 2006. Oficialmente, o governo admite a irregularidade apenas a partir de 2019. Ou seja: há quase duas décadas, aposentados vêm sendo cobrados indevidamente por algo que não contrataram. E por que ninguém impediu? Por que o INSS não verificou os registros? Por que as associações tiveram acesso facilitado aos sistemas públicos para executar esses descontos?
As perguntas são muitas. As respostas, poucas. E a reação social, praticamente nula.
Se o golpe tivesse atingido o sistema bancário, ou um órgão ligado à elite financeira, não faltariam manchetes, editoriais e medidas emergenciais. Mas, como atingiu os invisíveis da sociedade, virou apenas mais um dado.
Pior do que a fraude é a frieza com que ela foi tratada por diversos governos. Ninguém agiu com urgência. Em vez de investigar o esquema, jogaram a culpa de um lado para o outro, enquanto os idosos seguiam sendo lesados mês após mês. Quando buscavam ajuda, eram empurrados para as próprias associações que os fraudavam. Um escárnio.
E o ressarcimento? Ainda é lento, burocrático, e insuficiente. Muitos dos lesados sequer têm acesso digital para fazer a solicitação. Outros nem sabem que foram roubados, mesmo com o governo informando que iniciou uma série de notificações pelo Meu INSS.
O que este escândalo revela não é apenas a falência de sistemas de controle. Revela também a falência moral de um país que aprendeu a ignorar seus idosos.
Não se trata apenas de números. Trata-se de dignidade. Quem desconta R$ 30 (ou mais) de um idoso que ganha salário mínimo está roubando não só o dinheiro, mas o alimento, o remédio, o direito a uma vida com menos dor.
A omissão é coletiva. E isso é o mais assustador. Porque enquanto houver silêncio, haverá espaço para mais golpes.