Buracos negros supermassivos podem funcionar como supercolisores naturais e revelar pistas sobre a matéria escura

Buracos negros supermassivos podem funcionar como supercolisores naturais e revelar pistas sobre a matéria escura
Estudo mostra que partículas que mergulham em direção aos buracos negros podem atingir velocidades impressionantes (Imagem ilustrativa de Roberto Molar Candanosa/Universidade Johns Hopkins)

Uma nova descoberta publicada na revista Physical Review Letters sugere que buracos negros supermassivos podem atuar como supercolisores naturais, produzindo colisões de partículas com energias semelhantes — ou até superiores — às alcançadas pelos maiores aceleradores de partículas da Terra, como o Large Hadron Collider (LHC), do CERN.

Se confirmada, essa possibilidade pode abrir um novo caminho para a detecção de partículas exóticas, incluindo potenciais candidatos à matéria escura, um dos maiores mistérios da física atual.

A busca por matéria escura pode ganhar uma nova via

O LHC tem sido a principal esperança dos cientistas para detectar partículas de matéria escura. Desde que entrou em operação, em 2010, o maior acelerador de partículas do mundo já ajudou a desvendar diversos segredos do universo subatômico, como a descoberta do bóson de Higgs. Porém, até agora, as experiências realizadas não conseguiram encontrar qualquer evidência direta da matéria escura.

“Uma das grandes esperanças para colisores como o LHC é gerar partículas de matéria escura, mas ainda não encontramos nenhuma evidência concreta”, afirmou Joseph Silk, professor da Universidade de Oxford e da Universidade Johns Hopkins, e um dos coautores do estudo.

Seção do Large Hadron Collider no CERN, referência de supercolisores de partículas.
Seção do Large Hadron Collider no CERN, referência de supercolisores de partículas. (Foto: CERN)

Diante disso, alguns pesquisadores vêm propondo a construção de aceleradores ainda mais potentes. No entanto, como destaca Silk, a própria natureza pode já estar realizando experimentos ainda mais poderosos no coração das galáxias, onde habitam os buracos negros supermassivos.

Colisões naturais com energias extremas

De acordo com o estudo, partículas que mergulham em direção aos buracos negros podem atingir velocidades altíssimas, semelhantes às geradas pelos aceleradores terrestres. Próximas ao horizonte de eventos — a “fronteira” do buraco negro — essas partículas colidem em um ambiente de gravidade extrema, liberando quantidades de energia impressionantes.

“Recentemente detectamos fótons de raios X originados desses fluxos de matéria que caem nos buracos negros, o que confirma que esses eventos ocorrem na natureza”, explicou o coautor do estudo, Andrew Mummery, físico teórico da Universidade de Oxford.

Utilizando simulações computacionais, a equipe demonstrou que essas colisões são muito mais violentas do que se imaginava anteriormente. Os pesquisadores destacam que, embora o processo não seja idêntico ao de um acelerador humano, o mecanismo é semelhante: partículas são aceleradas por campos gravitacionais e magnéticos extremos e colidem a velocidades altíssimas.

Sinais podem chegar até a Terra

Um dos aspectos mais empolgantes da descoberta é que algumas partículas geradas nesses processos violentos podem escapar do buraco negro e viajar pelo espaço até atingirem a Terra. Segundo os cientistas, essas partículas poderiam ser detectadas por instrumentos já em operação.

“Se buracos negros supermassivos conseguirem gerar essas novas partículas por meio de colisões de prótons em altíssima energia, poderemos eventualmente detectá-las aqui na Terra, atravessando rapidamente nossos instrumentos”, explicou Joseph Silk. “Isso seria uma prova de que esses objetos misteriosos estão funcionando como verdadeiros supercolisores cósmicos, alcançando energias que jamais conseguiríamos atingir na Terra.”

Entre os observatórios que poderiam captar esses sinais estão o IceCube Neutrino Observatory, localizado na Antártida, e o KM3NeT, um detector submarino no Mar Mediterrâneo. Recentemente, inclusive, o KM3NeT detectou o neutrino mais energético já registrado, alimentando ainda mais as especulações sobre a existência dessas fontes cósmicas extremas.

Uma oportunidade única para a física de partículas

A possibilidade de estudar essas partículas vindas de buracos negros supermassivos abre uma janela inédita para a física de partículas e cosmologia. Isso porque essas colisões naturais podem alcançar níveis de energia impossíveis de serem gerados pelos equipamentos humanos mais modernos, oferecendo uma oportunidade única para investigar fenômenos ainda inalcançáveis em laboratórios terrestres.

“Descobrimos o quão energéticos esses feixes de partículas poderiam ser: tão poderosos quanto um supercolisor ou até mais. É difícil definir o limite, mas certamente atingem as energias dos novos supercolisores que planejamos construir”, destacou Silk.

Embora os buracos negros estejam a bilhões de anos-luz de distância, as partículas que escapam desses eventos podem cruzar o universo e atingir a Terra, oferecendo indícios valiosos sobre a composição do cosmos e, quem sabe, finalmente revelar a natureza da matéria escura.

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