No Rio Grande do Norte, ser pessoa com deficiência ou com doença rara quase sempre significou lutar o triplo para conseguir a metade. Metade do acesso, metade da estrutura, metade da visibilidade. O resto vem por esforço da família, caridade de instituições ou fé.
Mas nessa quinta-feira (19), o Diário Oficial trouxe algo que merece ser dito com todas as letras: virou lei o Programa de Fisioterapia e Terapia Ocupacional para Pessoas com Deficiência ou Doença Rara, sancionado pela governadora Fátima Bezerra após aprovação pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Norte.
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É uma daquelas leis que, quando bem aplicada, não resolve tudo — mas muda muito. A Lei Nº 12.214/2025 já está em vigor e o Governo poderá iniciar a execução com base legal e técnica.
O que diz a nova lei
O programa nasce com quatro objetivos centrais:
- Contribuir para a prevenção de doenças nesse público, que muitas vezes já vive com o corpo em estado de alerta;
- Garantir assistência e reabilitação de saúde, não como favor, mas como direito;
- Restabelecer condições satisfatórias de vida após crises, lesões ou episódios de agravamento;
- Promover educação em saúde, considerando limitações cognitivas, motoras ou sociais de cada pessoa atendida.
Tudo isso sob um eixo central: a pessoa com deficiência ou doença rara como sujeito de cuidado — não como peso, nem como estatística.
A nova lei se aplica a moradores do Estado do Rio Grande do Norte com deficiência ou diagnóstico de doença rara, com atendimentos realizados por meio de instituições de saúde, projetos da assistência social e entidades parceiras, de natureza pública ou privada.
Ou seja: é uma política que se articula com a rede existente, mas também permite expansão territorial e adaptação à realidade local de cada município, com base em parcerias formais.
Fisioterapia e terapia ocupacional: ações concretas
O texto legal detalha o que se espera das equipes profissionais. Isso evita interpretações genéricas e fortalece o cumprimento efetivo da norma.
Na fisioterapia:
- Reabilitar ou manter funções dos sistemas nervoso, osteomuscular, circulatório, respiratório e urinário;
- Tratar escaras, queimaduras e outras lesões de pele;
- Evitar ou reduzir perdas musculares e ósseas, estimulando força e mobilidade;
- Reduzir a dependência de medicamentos, especialmente no controle da dor;
- Atuar sobre doenças inflamatórias, osteodegenerativas e neurodegenerativas, buscando desacelerar sua evolução;
- Oferecer orientação específica a cuidadores e familiares.
Na terapia ocupacional:
- Ampliar a autonomia nas atividades de vida diária, adaptando tarefas e utensílios;
- Organizar os espaços domésticos e sociais, priorizando funcionalidade e segurança;
- Reabilitar funções cognitivas e prevenir perdas neurológicas;
- Tratar impactos psicoemocionais e promover estabilidade afetiva;
- Reorganizar o tempo livre como espaço de significado e autoestima;
- Formar cuidadores com instruções práticas e individualizadas.
A norma também estabelece uma exigência clara: os profissionais envolvidos devem estar devidamente registrados no CREFITO (Conselho Regional de Fisioterapia e Terapia Ocupacional).
Esse detalhe reforça a seriedade da proposta e impede improvisações — é um programa para ser executado por quem tem competência técnica comprovada.
Parcerias, estrutura e execução
O artigo 6º da lei permite que o Estado celebre convênios com instituições públicas ou privadas. Isso viabiliza a presença do programa em regiões onde a estrutura pública ainda é limitada, como em parte do interior potiguar. Também permite sinergia com entidades filantrópicas, comunitárias e clínicas especializadas.
É uma via para ampliar o cuidado sem criar barreiras burocráticas — e com flexibilidade jurídica para atender onde for preciso.
Essa lei pode ser um divisor de águas para milhares de famílias potiguares que lutam diariamente contra o abandono estrutural. Famílias que lidam com doenças raras, que exigem terapias contínuas, ajustes na rotina, apoio físico e psicológico — e que raramente encontram resposta rápida do Estado.
Agora, há um instrumento concreto. Com base legal, recursos humanos, exigência técnica e possibilidade real de execução.
E um pioneirismo que precisa ser reconhecido
Com a sanção da Lei Nº 12.214, o Rio Grande do Norte se torna um dos estados pioneiros na criação de um programa estadual específico voltado à assistência multidisciplinar de pessoas com deficiência e doenças raras, integrando fisioterapia, terapia ocupacional, educação em saúde e apoio aos cuidadores.
É um marco. Mas, como toda lei, só terá valor real se sair do papel. A responsabilidade, agora, é de todos: gestores, profissionais, instituições e sociedade. Porque dignidade não se inaugura — se constrói.